quarta-feira, 8 de junho de 2005

A GREVE

Apesar de o tratado (ou será constituição?) constitucional europeu ter sido declarado morto no programa "pós e contra"- um programa um tanto para o 'morto-vivo' uma vez que os que lá estiveram estavam quase todos de acordo (faltou um fervoroso defensor do sim, por outras palavras um defensor das políticas à Chirac) - eis que surge um sítio a favor do sim.

Enquanto professor, preocupa-me as alterações que governo se prepara para fazer às condições da carreira docente. Retirada de previlégios, de 'progressão automática' - nao sei bem o que é, eu para mudar de escalão tive de obter créditos de formação, tive de escrever um 'relatório crítico' que teve que ser avaliado e classificado, e de cuja classificação a progressão está dependente - retirada de possibilidade de reforma aos 60 anos de idade (é necessário discutir os moldes em que um professor de 60 anos trabalha. As suas condições de trabalho não podem ser iguais às de um professor de 35 anos de idade); retirada da reforma por inteiro, etc. Por outras palavras, ser docente, vai definitivamente (pois a queda já começou à muito) tornar-se uma coisa indesejável.

De vez enquando aparece um a exigir aos professores que 'aumentem a produtividade'. Quando se trata de ensinar, de cultivar a busca apaixonada da sabedoria (prática ou teórica), quando se trata de aprender a ser cidadão crítico e atento - não é isto a educação? - que significado pode ter o 'aumento de produtividade? Receio que signifique mais horas de trabalho (logo menos preparação, menos estudo, menos saber), mais alunos por turma, mais massificação, mais ensino por memorização, etc. Quando se mistura economia e educação o resultado só pode ser desastroso. A educação não pode ser vista como um meio para nada, ela é um fim em si.

É também preciso dizer que os professores têm grandes culpas desta queda no fosso; assistiram àquele processo de degradação impávidos e serenos, como se não fosse nada com eles. Como se, estando o seu lugarinho assegurado e as suas aulinhas mais ou menos preparadinhas, não fosse preciso fazer mais nada. Eu já cá estou e eles não me tocam - diriam alguns...

Os sindicatos convocaram uma greve de quatro dias que coincide também com alguns exames, e a meu ver não fizeram mais do que o seu papel - defender os interesses dos professores. O que nem sempre é o caso: sabe-se que muitas vezes o sindicalismo é usado como forma de obter vários empregos o que é indesejável e condenável. O sindicato passa a ser um lugar para alguns dos professores que lá estão defenderem os seus interesses. Seria bom que a Ética também chegasse aos sindicatos.

Portanto, concordo com a greve. Se existem sindicatos, se existe a possibilidade de greve, se governo nos ataca descaradamente, a defesa é mais do que legítima. Sempre achei que as formas de luta dos sindicatos eram débeis e demasiado 'light'. Defendo, quando da parte do governo não há vontade de diálogo, lutas a sério (pelo menos à altura dos ataques); greve coincidentes com os exames, greves de quinze dias, greves por tempo indeterminado, etc. Dizem alguns que a magra carteira dos professores não aguenta tantos dias sem salário. Mas isto não é problema, os sindicatos podem muito bem arranjar formas de compensar os professores, distribuído senhas de alimentação para vários dias, pagando algumas despesas, ajudando os mais necessitados! No fundo os sindicatos também são alimentados pelos professores.

Esta é a visão de alguém com interesses directos na matéria. É claro que uma avaliação objectiva requer dar atenção às razões das outras partes interessadas no caso. Discutir objectivamente com os outros, mudar algumas das nossas posições, se nos mostrarem que elas estão erradas, conceder e negociar alguns pontos...

É preciso ver o lado dos estudantes que serão prejudicados pela greve (mas greve significa isso mesmo, causar prejuízo como forma de pressão). A questão é saber se o prejuízo é, ou não, justificado. O que pensarão eles disto tudo? Os pais já estão a dizer que discordam da greve e que os seus filhos estão a ser usados como 'arma de luta'. Prejudicar será o mesmo que usar? É preciso ver o lado dos outros trabalhadores que estão pior. E também necessário ver o lado dos que estão muito melhor. É preciso olhar para o país que ao fim de sucessivos desgovernos, está na penúria...

O que resultará da reunião que está prestes a acontecer entre governo e sindicatos?


(LFB)