domingo, 30 de abril de 2006

o livrinho grátis


A revista Sábado oferece todas as semanas (um livro por semana e durante oito semanas) aos seus leitores, sem que se tenha que pagar mais por isso, livrinhos introdutórios extraordinários; os autores são autoridades na matéria, os livros são muito bem escritos e contém ilustrações ilucidativas e informativas o que torna a leitura leve e interessante, os temas são actuais...
Os originais ingleses sempre foram para mim importantes e fascinantes. Fazem parte de uma reformulação que a Oxford University Press a bom tempo submeteu à sua velha colecção de introduções a grandes personalidades intitulada "Past Masters" (a introdução a Wittgenstein de A. C. Grayling, ou a introdução a Machiavelli de Quentin Skinner são dois exemplos que me marcaram pela clareza, rigor e capacidade de se fazer entender). Em Portugal, nos anos oitenta, a editora Dom Quixote traduziu alguns destes livros numa colecção que intitulou "Mestres do Passado", mas as traduções eram más e as revisões simplesmente inexistentes ao ponto de nunca conseguirem ser uma substituição digna do original inglês (embora mantivessem o precioso índice analítico). A referida reformulação da O.U.P. passou por um novo grafismo (muito melhor e muito mais atraente que o da "Past Masters") ao qual a edição portuguesa se mantém fiel; por dar um novo título à colecção – agora designada de "A Very Short Introduction"; e por alargar o seu âmbito a temáticas e já não apenas a autores, bem como por incluir novos títulos. Desta nova colecção já li e recomendo Democracy de Bernard Crick (publicado pela primeira vez em 2002 e que irá ser oferecido pela Sábado, a mim custou-me 15 euros, incluindo transportes!) e Anarchism de Collin Ward (2004).
As traduções portuguesas agora oferecidas trazem também a chancela da editora Quasi e a cedência de licença da Editorial Temas e Debates, o que indicia que se calhar iremos ter em português mais títulos do que os oito agora anunciados. Pelo que me apercebi da leitura da primeira oferta – O Alcorão – a tradução e a revisão parecem cuidadas o que é um bom presságio. Só é pena que uma peça tão boa tenha sofrido a amputação do índice analítico. Nunca compreendi a razão que leva tantos editores portugueses a cometer tal acto. Será que mais duas ou três páginas encarece assim tanto o resultado? Será por descuido? Será por pensarem que essa parte do livro não interessa?
Vou enviar este post aos editores pode ser que me saibam responder (presunção minha) ou, melhor ainda (e maior a presunção), que o dito índice seja incluído nos próximos volumes.



(LFB)

quarta-feira, 26 de abril de 2006

sábado, 15 de abril de 2006

uma religião refundada



Não será a recente descoberta do evangelho de Judas suficiente para refundar a religião cristã? Para recomeçar a contagem do zero outra vez? Um Jesus que ri à gargalhada, um Judas descrito como o apóstolo dos apóstolos, uma crucificação ausente e os especialistas a afirmar que a verdade acerca do que realmente se passou nunca será descoberta, parece-me suficiente para repensar os principais dogmas do cristianismo.


(LFB)

quinta-feira, 13 de abril de 2006

A invenção da "nossa vida"

Um das causas da doença da República e dos parlamentos (nacionais e regionais) é precisamente a invenção da vida privada e as suas nuances contemporâneas. Pode ser-se presidente da Republica, presidente de uma região autónoma ou de um parlamento, pode ser-se deputado, secretário, director regional, professor, médico, ou até dirigente sindical, etc., mas não se deixa por isso de ter a "nossa vida" e esta não deixa de ser mais importante e de estar acima da nossa vida pública; embora, nestes exemplos, seja esta o sustento daquela.
Vem isto a propósito da recorrente inferiorização da classe política que se revela em actos nacionais como a falta de quórum de ontem na assembleia nacional (e falta de ética, muitos deputados assinaram mas não estiveram presentes) e em actos regionais como o episódio discutido no plenário do mês de Fevereiro, relacionado com o facto de alguns deputados terem sido acusados por outros de não fazerem nada; até se poderia dizer que a discussão foi acerca do facto de nada haver para se fazer no parlamento regional. Houve um deputado que respondeu – como que a corroborar a ideia aqui esboçada – que se era para não fazer nada ele tinha coisas mais importantes para fazer em sua casa! O problema é que todos temos a nossa vida e esta tornou-se mais interessante (porque nos dá mais prazer) e mais viciante (porque exige muitas compras) do que qualquer assunto público, até mais importante do que a aprovação de leis em assembleia nacional.
Os gregos clássicos – que pensaram profundamente a democracia – tinham parte desse problema resolvido porque entregavam as questões da economia privada às mulheres e aos escravos ('economia' significa etimologicamente as leis da casa) e porque ligavam o ideal democrático à liberdade exigindo que qualquer homem que se quisesse dedicar ao serviço da polis (a vida virtuosa por excelência) fosse livre o suficiente para isso; quer dizer, tivesse liberdade política para participar nas decisões colectivas, mas também que tivesse liberdade privada, que pudesse viver como quisesse. Aí era o exercício da cidadania activa que conferia direitos políticos; se não se fosse capaz de exercer a cidadania (como se julgava ser o caso das mulheres e dos escravos) não se era simplesmente cidadão. Em muitos aspectos somos mais romanos (foi a Roma, e não à Atenas democrática, que os revolucionários republicanos do século XVII foram buscar inspiração política para acabar com os monarquias) do que gregos, e conseguimos alargar a cidadania ao ponto de já não sabermos bem o que ela significa. Tal como os romanos, procuramos estabelecer regras de equilíbrio entre os governantes (a classe dos senadores) e os governados (o populus) mas, de alguma maneira, perdemos a confiança nos políticos. Aqui surge um problema fundamental: o que fazer quando os cidadãos de uma republica democrática deixaram de confiar naqueles que foram escolhidos para serem os dirigentes da nossa vida comum?

(LFB)

terça-feira, 11 de abril de 2006

O valor da vida

O protesto e a marcha de indignação que se realizaram na ilha Terceira no passado fim-de-semana, relacionados com a morte inesperada de uma jovem de 17 anos por alegada negligência médica (a jovem foi por várias vezes ao serviço de urgência do Hospital tendo sido mandada para casa com diagnóstico de gripe) e as exigências serenas e razoáveis (o que é difícil perante uma tragédia desta natureza) que se ouviram por parte dos manifestantes – que nas urgências sejam tratadas como "pessoas e não como animais"; que as autópsias sejam feitas por médicos de fora; que se acabe com o corporativismo nos hospitais; isto é, médicos a proteger médicos, entre outras – são uma demonstração (ainda que pelas razões mais trágicas que se possam imaginar) do que se pode, e do que se deve, fazer para exibir o nosso descontentamento perante o ultraje que é ser mal atendido por um médico do sistema nacional de saúde. Independentemente de haver, ou não, neste caso concreto, negligência médica, o facto é que existem problemas graves no atendimento médico público. Muitas das pessoas presentes na manifestação e que deram a cara, tinham sido também elas vítimas de descuidos médicos. Todos nós temos o poder de protestar e de exigir que cada um cumpra bem a sua função. Este acontecimento mostra que as pessoas, se unidas em torna de um problema que as afecta, só por si – independentemente dos partidos – são capazes de chamar a atenção para o que está mal e de fazer exigências razoáveis para o melhorar. O que se irá seguir a isto, ninguém sabe. Pode até ser que tudo fique na mesma; que quem pode seja atendido nos consultórios, e que quem não pode seja atendido nas urgências. Que as pessoas continuem a formar-se em medicina, não por vocação e dever de ajudar os outros, mas por ser uma profissão economicamente muito gratificante. Os médicos têm muito poder (mas as pessoas também!), o tempo apazigua o sofrimento e o dia-a-dia transmite-nos a ilusão da normalidade. Mas o facto de um movimento civil se erguer contra as injustiças e de falar, e bem, para a comunicação social demonstra que, contra o que muitos nos querem fazer querer, outros caminhos para a justiça, que não apenas os traçados pelos políticos de secretária, são possíveis.

(LFB)

domingo, 2 de abril de 2006

o tubo de Santa Catarina










Santa Catarina é uma praia de basalto venerada pelos surfistas e localizada no cabo da praia, ilha Terceira. É considerada a praia com melhores tubos dos Açores e uma das melhores de Portugal. Ontem assisti a um encontro dos 'cavaleiros das ondas', um movimento de surfistas local que alerta para os perigos que o seu santuário sofre. São dois esgotos que lá despejam as suas águas – um do matadouro e outro vindo da fábrica de conservas. Para além disso, a zona circundante foi invadida por tetrápodes, esses gigantes pés de galinha de cimento que aguardam a sua vez para irem quebrar as ondas lá mais fora. Enquanto isso, à nossa volta a costa visível perde a sua beleza natural.
Ontem, infelismente, o mar não permitiu que as pranchas entrassem na água; "Mortífero" foi como o classificou um dos presentes. Só os "bifes" (americanos que por ali aparecem) são ingénuos o suficiente para entrarem ali com um mar destes. No dia anterior, com um mar semelhante, estiveram lá dois "bifes"; resultado: duas pranchas partidas, um ombro descolado e alguns cortes e arranhões.

(LFB)